Pájaro: o teatro independente chileno voou até ao Porto

02 Jun

Trinidad Gonzalez, uma das mais reconhecidas atrizes e encenadoras chilenas da atualidade, trouxe ao FITEI o seu PÁJARO, obra realista e depurada de artifícios em que três amigos entram num jogo de relações de poder com um sem-abrigo que, inesperadamente, afirma ser um pássaro.

PÁJARO é uma obra impactante pela forma crua e irónica como aborda a violência e o desespero do ser humano quando confrontado com a diferença - e em particular quando essa diferença abala a suposta formação humanista dos personagens com tiradas desconcertantemente coerentes e capazes de fazer estalar o verniz artístico-burguês-boémio.

“Há uma espécie de realismo alienado neste espetáculo. Quero que as pessoas saiam dele confusas, sem ideias claras!” - explica Trinidad, que tinha já cerca de metade do espetáculo escrito quando começou os ensaios com os outros três atores que compõem o elenco: María Fernanda Olivares, Nicolás Pavez e Nicolás Zárate.

Depois de duas semanas de experimentações na sala de sua casa (cuja decoração acabou por inspirar a cenografia da peça), os quatro atores separaram-se. Um mês depois, Trinidad voltou a reunir o grupo já com a totalidade da peça escrita. Foi, assim, um processo de escrita que bebeu inspiração do trabalho dos seus companheiros de palco: “Não me interessam os atores-intérpretes, por mais virtuosos que sejam. Quero trabalhar com atores-criadores, que trazem algo seu ao processo”.

O teatro independente chileno, tendencialmente político, é crítico e precário porém também consciente de que a escassez de recursos pode ser criativa. “As companhias acabam por criar os seus próprios textos e assim, como que sem querer, vão surgindo novos dramaturgos. É um trabalho que não é totalmente underground porque é profissional, mas que comporta uma certa marginalidade, que acaba por ser a nossa força.”

PÁJARO não é uma ave rara; é antes uma das duas propostas chilenas para os 40 anos do FITEI. A segunda, CASCO AZUL de Antonio Altamirano, chega nos dias 13 e 14 de junho ao Teatro Municipal de Matosinhos Constantino Nery e no dia 16 à Casa das Artes de Felgueiras.